sexta-feira, 29 de dezembro de 2006

perdidos e achados.



alguém viu por aí o meu sistema imunitário?



*fotografia roubada à lebre.

domingo, 24 de dezembro de 2006

and I ran with a heart on fire.



t
. s. eliot mentiu-me.
abril foi o primeiro mês.

a véspera e o dia.


ao olhar para a intermitência das luzes, lembrou-se que não sabia do interruptor das presenças contínuas.

sexta-feira, 22 de dezembro de 2006

ironia muda.


num dia afónico, sente que falou mais do que nos dias de palavras plantadas na língua.

[fotografia de honanna olsson]

sábado, 9 de dezembro de 2006

sorrisos numéricos.


o oito é um número redondo.
a felicidade é redonda.
[não se sabe bem onde estão o início e o fim da felicidade circular]
o oito é um número feliz.

quarta-feira, 6 de dezembro de 2006

a simplicidade não se veste, anda nua.


where is my love
where is my love
horses galloping
bring him to me


where is my love
where is my love
safe and warm
so close to me
in my arms
finally
there is my love
there is my love.

[cat power].
*fotografia de amanda marsalis.

terça-feira, 28 de novembro de 2006

ao afogar os medos.




it's cold I'm afraid
it's been like this for a day
the water is rising & slowly we're dying
we won't see light again







[matt elliott
,
the kursk]

*fotografia de amanda marsalis.

sábado, 25 de novembro de 2006

entre-beijos.


ele não sabe
que quando ela inicia o choro
[entre-beijos],
acredita no pesadelo em viva carne,
dorme na insónia do desamor.
rasga o dia em que conseguiu dar um lugar,
a seu lado,
ao voo ascendente de uma narrativa aberta.

dare to love me.


prossegue nos gestos não pares procura permanecer sempre presente
deixa docemente desvanecerem-se um por um os dias
e eu saber que aqui estás de maneira a poder dizer
sou isto é certo mas sei que tu estás aqui.*

*ruy belo, toda a terra.
fotograma de jeux d'enfants.

quarta-feira, 22 de novembro de 2006


do outro lado da rua,
do lado em que se vive na sobreposição da vida,
do lado em que se vive na observação dos passos,
reparou que ela saía todos os dias de abandono no olhar
e sombra debaixo do braço.


[fotografia da fabulosa alice lemarin].

quatro de dezembro.


I wanted to fucking blow my brains out every five minutes and I didn't know how to explain it to any of my friends, because I never got to see them. I was touring. So the moments I would see them, I would try to be happy for them, because I never got to see them. But I didn't reveal what I was going through emotionally.


Cat Power em entrevista realizada por Fred Armisen e Brandon Stosuy, treze de novembro de dois mil e seis.

quinta-feira, 16 de novembro de 2006

verdades cibernáuticas.



você não pode pedir a atenção de alguém com tanta frequência.


[...]

*fotografia roubada d'aqui e d'aqui e d'aqui.

terça-feira, 7 de novembro de 2006

dá licença?




eu quero uma licença de dormir,

perdão pra descansar horas a fio,

[...]*

*adélia prado.
fotografia de alice lemarin.

quarta-feira, 25 de outubro de 2006

dita(dapta)do.



é fácil colher bons ventos em tempestades alheias.

ter o corpo em espera.



não ter tempo para o tempo rasga as paredes da palavra.
não ter tempo para o tempo junta os retalhos de um doloroso silêncio.
não ter tempo para o tempo põe o ponto final aqui.

[fotografia de joana linda]

sexta-feira, 20 de outubro de 2006

o centro das desatenções, parte II.



como se naquele funeral, ela fosse a própria defunta.


[fotografia de dorthe alstrup].

o guião de todos os dias.


we have a whole life to live together you fucker, but it can't start until you call.

[christine jesperson, me and you and everyone we know].

quinta-feira, 5 de outubro de 2006

o [meu] novo cinco de outubro.


implantação da incerteza.

domingo, 1 de outubro de 2006

o centro das desatenções.



como se naquele funeral, ela estivesse vestida de vermelho.


[fotografia de susanna majuri]

sexta-feira, 22 de setembro de 2006

une hirondelle fait le printemps.



mírenme, a la vida vuelvo ya
la la la
pajarillo, tú me despertaste
enséñame a vivir
en un abismo yo te esperé
con el abismo yo me enamoré

pájaro, me despertaste
pájaro, no sé porqué
mírenme, a la vida vuelvo ya
la la la

[lhasa, el pájaro].
*ilustração de cristina valadas.

segunda-feira, 11 de setembro de 2006

como um conto primário.


but he's been pretty much yellow
and I've been kind of blue
but all I can see is
red, red, red, red, red now
what am I gonna do?

[fiona apple, red red red].
*pintura de piet mondrian.

o outro lado.


fotografia de Jean-Marc Bouju, France, The Associated Press.
[An Najaf, Iraq, 31 March 2003. Iraqi man comforts his son at a holding center for prisoners of war.]

porque nunca se deve esquecer o dia em que se esqueceram outros dias noutros mundos, em que uma política de medo nasceu para despoletar uma guerra sem sentido, sem fim.
devemos a quem não sobreviveu a promessa de encontrar a verdade por debaixo dos escombros, a promessa de derrubar desejos imperialistas de quem se atacou a si próprio, de intolerância e ignorância na mão, albergando a desculpa de uma luta contra um terrorismo que eles mesmos cultivam.
oliver stone alega que "nesse dia o mundo viu o mal". pois nos outros dias todos, nesses outros mundos, outro tipo de torres são derrubadas por um mal que é deliberadamente camuflado, deliberadamente minimizado, deliberadamente defendido por quem não sabe senão ver a História pela lente distorcida do olho americano.

segunda-feira, 28 de agosto de 2006

o presente em provérbio.


contar este conto e acrescentar pontos de exclamação;
deitar-te cedo e cedo erguer-me para ti, dar saúde ao doentio medo da perda e deixar crescer a história de parágrafos mil;
beijo a beijo encher o papo;
arriscar e petiscar-nos;
ter-te dentro da minha mão e ter dois olhos tristes a voar.

hoje.



quero voltar a ser princeZa, guardar os sonhos na barriga, comer as palavras que antecipam a destronação, continuar cor-de-rosa até depois da meia-noite-hora-do-final-infeliz.
quero entrar no mundo de uma maria de cinco anos e ouvi-la dizer, com cara de óbvia sabedoria: és princeZa, não és rainha, porque as princeZas têm os vestidos mais bonitos!
quero voltar a ser princeZa com Z, porque com princesas com S há muitas.


*fotografia de marie hochhau.

domingo, 30 de julho de 2006

contrastes.


em meu redor, amores-que-me-parecem-perfeitos vão sendo semeados e colhidos pelos dias de verão.
em meu redor, futuros de brilho maior aproximam-se de hoje. espelham-se na minha inércia contrastes de quem parte em busca da substância e se esquece de uma forma de vida oca.


*fotograma de vie privée, louis malle.

[danç]arte no coração.*


há pequenas coisas que, à medida que se vão absorvendo na ausência dos dias, engrandecem de modo irremediável.


digo-o com letras pequeninas porque a palavra é tão grande e assusta tanto e dói e mói e entretanto pode ser que te percas neste polissíndeto interminável que me ajuda a fugir para longe, bem longe daqui, onde o amor levita e faz dançar os pés longe do chão.



gracias a tu cuerpo doy por haberme esperado

tuve que perderme pa’ llegar hasta tu lado

gracias a tus brazos doy por haberme alcanzado

tuve que alejarme pa’ llegar hasta tu lado

gracias a tus manos doy por haberme aguantado

tuve que quemarme pa’llegar hasta tu lado


[lhasa, Pa'llegar a tu lado]

.*hífen omitido propositadamente.

quarta-feira, 26 de julho de 2006

na presença da ausência.


descansa, (...), que levo o teu nome e as tuas certezas e os teus sonhos no espaço dos meus.

josé luís peixoto, morreste-me.

[con]sequências dos dias.



e as semanas passaram a ser meras sequências de números, encarnando antecipações de paragens cardíacas, de tremores que de novo nada têm.
o fim é para a semana que vem, o fim é no mês seguinte, o fim existe e vai chegar. mais sequência, menos sequência, o amor morre nas minhas mãos.

[fotografia de alice lemarin].

quinta-feira, 6 de julho de 2006

pesadelo.


acordar cedo e não acabar o sonho.
[e perceber que não vai ser um filme a ensinar-te que me podes aprender].




*fotografia de joana linda.

lição número um.


you can learn me.

tessa to justin quayle in
the constant gardener.

terça-feira, 4 de julho de 2006

abrir a janela e cair na vertigem da ausência.


si un día te vás
y ya no vuelves más

si un día me voy
y ya no vuelvo yo

que grán silencio
todo en suspenso
que vértigo de no verte

retumbo
como una campana


abro la ventana
y entrás tu
entrás tu.




[lhasa].
*pintura de edward hopper.

quinta-feira, 29 de junho de 2006

said oa oiràrtnoc.


há dias virados ao contrário em que os pés caminham sobre as nuvens, despertam a chuva e adormecem a claridade.

há dias em que a manhã nunca chega e o sol tarda.
há dias em que o início madrugador não chega a ser dia.
há dias em que o coração sai pela boca.
há dias em que o coração sai pela boca e deixa os batimentos para trás.

[fotografia de nina sundberg].

quando o coração sai pela boca.



diego: I'm here to see how you are. how are you?

frida:
tired of answering that question. otherwise, like shit.

sexta-feira, 23 de junho de 2006

match point.



nola rice : I don't think this is a good idea. you shouldn't have followed me here.

christopher wilton :
do you feel guilty?

nola rice :
do you?

fotograma de
match point, woddy allen.

os dias não trariam o inverno de volta se, depois da culpa, surgisse um beijo redentor.

terça-feira, 20 de junho de 2006

palavras leva-as a cidade.



[...]

a cidade é um céu de palavras paradas
a palavra distância e a palavra medo.


[...]

não há céu de palavras que a cidade não cubra
não há rua de sons que a palavra não corra
à procura da sombra de uma luz que não há.



[ary dos santos].

promessa.


esperar ver cumprida a
[vida multiplicada e brilhante*].

*sophia de mello breyner.

domingo, 18 de junho de 2006

medicinal.


engolir o coração para digerir a paragem cardíaca.


*frida kahlo, as duas fridas [1939]

sexta-feira, 16 de junho de 2006

o que importa, 53.



[...]
afinal o que importa é não ter medo:fechar
os olhos frente ao precipício
e cair verticalmente no vício
[...]

mário cesariny
[nobilíssima visão (1945-1946), in burlescas,
teóricas e sentimentais (1972)].

sexta-feira, 26 de maio de 2006

tragicomédia.


[...] a imaginação é uma faculdade da alma, a alma é o que nos dá a vida, a vida acaba na morte, a morte faz-nos pensar no céu, o céu está por cima da terra, a terra não é o mar, o mar está sujeito aos temporais, os temporais atormentam os navios, os navios precisam de um bom piloto, um bom piloto tem prudência, (...) a necessidade não tem lei, quem não tem lei vive como bruta fera, e por consequência sereis condenado a todos os demónios.
[esganarelo, d.joão. molière, acto v, cena 2].

deixem-me em dias imaginados, na alma viva de memórias futuras, longe da vida moribunda, acima das nuvens, longe das ondas que arrastam o sonho.
se me quiserem nessas ondas, que me deixem guiar o navio, de audácia na proa, sem prudência, libertando a necessidade.
que me deixem atravessar essas ditas tormentas, ser bruta fera, fera em bruto, condenada ao desmoronamento dos anjos, ao erguer dos demónios.

*fotografia de joana linda.

my own gene kelly.


quando rodeada de produtos que condensam ingredientes, frutos de imediata prontidão para serem consumidos, temperos feitos de especiarias ao molho e fé em ninguém, recebo-te aos bocadinhos, às pequenas peças, em pequenos detalhes.


saborear a amizade em goles curtos, mas de aroma distintamente único. reservar para ti o travo essencial, o gosto de provar devagarinho e, a pouco e pouco, conhecer o verbo descobrir[-nos].


*fotograma de for me and my gal.



quinta-feira, 27 de abril de 2006

da primeira vista.


creio que foi o sorriso,

o sorriso foi quem abriu a porta.
era um sorriso com muita luz

lá dentro, apetecia
entrar nele, tirar a roupa, ficar
nu[a] dentro daquele sorriso.

correr, navegar, morrer naquele sorriso.*


sim. acho que foi isso mesmo.
um sorriso. o sorriso.

*eugénio de andrade.
fotograma de la frontière de l'aube.

quarta-feira, 26 de abril de 2006

she's a maniac.*



cinco manias:


.da perseguição.

.de sublinhar as palavras, as frases, os livros que alimentam os olhos, o coração e o corpo.


.de escrever a meia-luz, falar a meia-luz, beijar a meia-luz, viver a meia-luz.

.do toque. experimentar com o toque, conhecer pelo toque e gostar através do toque.

.de guardar tudo e todos em mim. de fazer colagens em cadernos-memória desses tudos e desses todos.

*fotograma de eternal sunshine of the spotless mind.

domingo, 23 de abril de 2006

amor a cinquenta.



perguntaste-me se procurava o amor.
sim, procuro o amor.
e, por vezes, a procura é tão voraz, tão alarve, que acabo por me esquecer de mim nos meandros de paixões acendidas por desejos-rastilho menos sensatos.
mas [há sempre o contraste entre o que se constata agora ou em dias passados], sabes que sei quando um grande amor, um amor não [re]buscado, não procurado, mal encontrado, surge e me cala a respiração de forma abrupta e eficaz. surge e asfixia a vida.
sim, antevejo um final infeliz - ils ne se marièrent pas et n'eurent beaucoup d'enfants -, um final pouco cor-de-rosa, a roçar o cinzento, a côr que não é e não deixa de ser.
sabes? também eu queria queimar a amargura, perdê-la de vez no incêndio da alma velha e cansada, corpo gasto e retalhado.
também eu queria amaciar a aspereza, alisar as rugas do abandono, os relevos da dor e do desamor.


o que me fazia chorar eram as coisas. apesar de não ter nenhum desgosto. e quando dava por mim a chorar, sem causa aparente, é porque tinha visto qualquer coisa sem querer.

[samuel beckett, primeiro amor].

sábado, 22 de abril de 2006

devine combien je t'aime.



gosto de ti esta altura toda, diz a pequena lebre castanha esticando-se muito.

e eu gosto de ti esta altura toda, responde a grande lebre castanha esticando-se ainda mais.

gosto de ti até à lua, diz a pequena lebre castanha.*



por sentir que a minha altura se assemelha às minhas palavras.
porque não chegam. não alcançam. porque se voam muito alto, logo se quebram no chão do esquecimento.

*[sam mcbratney, adivinha quanto eu gosto de ti].
imagem de anita jeram.

terça-feira, 11 de abril de 2006

quinta-feira, 30 de março de 2006

what comes is better than what came before.


oh I do believe
in all the things you say
what comes is better than what came before
and you'd better come come, come come to me
better come come, come come to me
better run, run run, run run to me
better come

and you'd better run run, run run to me
better run, run run, run run to me
better come, come come, come come to me
you'd better run*



*cat power, I found a reason.
fotograma de lost in translation.



não gosto de despedidas, disse-me.
não gosto de distâncias próximas, disse-lhe.
guardar-te-ei, disse-me.
longe do coração.
longe do coração, digo-te.


quarta-feira, 29 de março de 2006

caixinha cor-de-rosa.


tenho uma caixinha cor-de-rosa

onde guardo um antigamente sorridente
pendente
tenho uma caixinha cor-de-rosa
onde sou bailarina de música muda
surda
tenho uma caixinha sem côr, com dor,
de um rosa já apagado, de madeira trabalhada a ferro, a fogo
trabalhada a fome de fruto não fugaz
trabalhada a sede de som de silêncio
fechada a sete segredos,
sete chaves que dançam tempos felizes.

terça-feira, 28 de março de 2006

quarta-feira, 15 de março de 2006

I got love to kill.*


l'oiseau qui chante dans ma téte
et me répéte que je t'aime
et me répéte que tu m'aimes
l'oiseau au fastidieux refrain
je le tuerai demain matin.

jacques prévert, histoires.
desenho de rhode montijo.
*juliette lewis and the licks.

tardia, a morte é tardia. o [re]nascimento é ineficaz. nascer todos os dias mata. matar todos os dias mata. inevitabilidade, os dias são feitos dessa inevitabilidade que se chama morte.