sexta-feira, 23 de dezembro de 2005

please answer the question.


em tempos de eleições - que vivem, por todo o lado, à minha volta -, eu própria tento eleger uma forma de vida que não assente em escolhas cambaleantes, decisões de firmeza duvidosa. decidir o sim ou o não ou, simplesmente, pôr a cruzinha no talvez. o que importa é a certeza, o anular da dúvida que me faz permanecer indefinida, incompleta, metade de fruto fora de época.
são tempos de eleições. e eu não tenho escolha.

fotografia d'aqui.

I'll wait for you and I'll burn.*


é nestes momentos de fracasso antecipado que cresce a certeza do que nunca serei - ou quererei ser.
dói-me a cabeça e o coração. preocupa-me mais a cabeça. é a razão a desvanecer-se e os impulsos afectivos a pisarem o que deve ser feito. é querer beijar a luz. é beijar a luz.

*jeff buckley, lover, you should have come over.
fotografia d'aqui.

she was a danger to herself.


and my head feels dead with all this useless fighting
but my head aint dead 'cause it keeps on loving.*


*yeah yeah yeahs, mistery girl.
na fotografia, karen o.

não.


não
à
tristeza
disfarçada
alcoolizada
vestida
de
cores
falsas
efémeras.
não
à alegria-fósforo.

quinta-feira, 22 de dezembro de 2005

make a wish.


please, mary poppins, please?


*fotograma de sex & the city.

sábado, 17 de dezembro de 2005

otorrinolaringologista.


nas palavras não cabe o amor.

o amor é maior - tão maior que as palavras são pequenas para amar.
quando era pequenina, diziam-me que otorrinolaringologista era a palavra maior do mundo.
tu vives nessa palavra.
vives nessa palavra porque o amor é grande e precisa de espaço para morar nas palavras.
o meu amor por ti é como essa palavra: otorrinolaringologista.


*fotografia d'aqui.


terça-feira, 13 de dezembro de 2005

knock knock.



quando a felicidade bate à porta
eu não estou em casa.

*fotograma de histoire(s) du cinéma, de jean-luc godard.

segunda-feira, 12 de dezembro de 2005

the weights, the weights into my little heart.*



he puts the weights into my little heart.


*interpol, obstacle 1.
imagem roubada a minh'ana.

terça-feira, 29 de novembro de 2005

do adeus e do fim.


e adormeci com o sabor a fim, a trilho apagado, a tristeza salgada.
eram as memórias a deitarem-se na almofada, a tentativa insistente emafastá-las do sono atrasado e elas a penetrarem um pensamento semi-sereno.
eras tu e o teu outro tu, porque tu não podes ser só um. eras tu a escorregar-me por entre os dedos e o futuro a rir-se de mim porque é vazio de ti, porque tem de ser vazio de ti. eram as desculpas que são culpas, os ódios que são amores, a indiferença que não é senão uma tentativa de restabelecer a paz, de restabelecer-me, porque isto não sou eu, isto não posso ser eu.
é o mundo a lançar dados nos meus dias e eu a não querer jogar mais. é estar farta de dar provas, de ultrapassar os nãos, de correr para não alcançar sim nenhum.


não sabia que a palavra adeus podia dar murros no estômago.

*fotograma de wristcutters: a love story.

quarta-feira, 23 de novembro de 2005

dúvidas perenes.



should I stay or should I go now?

if I go there will be trouble
an' if I stay it will be double.*

*the clash.
fotografia de chooupinette.

terça-feira, 22 de novembro de 2005

quarenta e nove.


nas manhãs esperadas, saía de casa - de olhos entreabertos para o mundo -, calcava a calçada suja, feita de rotina colada ao hábito e seguia para o número quarenta e nove.
dia seguido de dia, tocava na campainha branca, à espera que os olhos verdes-verdes subissem as escadas da casa-abrigo.
um dia, num amanhecer como os outros, o olhar acordou mais aberto. assustado. como se não pudesse fechar-se para o futuro instante. a calçada parecia-lhe menos regular e os passos aceleravam o prenúncio matinal.
ao soar estridente do toque branco, os olhos verdes-verdes não acordaram. do interior da cave, não surgia nada, senão o cheiro do medo, um odor moribundo e algumas certezas que não queria certas.
disseram-lhe: "os olhos verdes cederam aos inúmeros avisos. o mundo não cabia nela. ela não cabia no mundo, sabes? adormeceram ao som da morte."
ela sabia a inevitabilidade deste discurso. há muito que receava a chegada deste dia. que temia os dias em que os olhos verdes ficavam em casa, enrolados em mistério, dentro das paredes de um quarto.
fecharam-lhe a porta do quarenta e nove e a dúvida.
respirou, então, a ausência dos olhos verdes-verdes. respirou bem fundo a memória das manhãs madrugadoras, preguiçosas. respirou os fins-de-tarde [tardios], envoltos em exaustão. bocejantes.
fechou a porta e lembrou-se de como esta ausência era tão necessária como previsível.
fechou a porta e seguiu. de mãos dadas com a vida.

*fotografia d'aqui.

quarta-feira, 16 de novembro de 2005

amanhã, liberdade.



empurro-me, todos os dias, para amanhã.
amanhã, amanhã, amanhã.
amanhã vou abrir as portadas da janela, colar a luz no quarto.
amanhã vou esconder-me de vocês, vou ficar enrolada no novelo que criei, vou arrumar coração e sangue e pele num canto do corpo e respirar um cenário novo.

'amanhã vou ser feliz, não vou, mãe?'
respirar um cenário limpo. livre de infinitas histórias finitas.
l-i-b-e-r-t-a-r--m-e.
soltar o orgulho amarrado e explodir a esperança.
negar o desamor e a nudez do coração. o meu coração. o teu desamor. negar-te.


fotografia de ryan mcginley.

segunda-feira, 7 de novembro de 2005

um, dois, três: respirar.



respirar uma noite construída em inícios do século XX, de som alto a perfurar o peito; a música a entrar e a ficar e a pedir para que permaneça como âncora em tempos agrestes.

era a vida a espelhar-se nos refrões cantados e eu a sussurrá-la para mim - baixinho, porque ninguém pode saber como sou prisão, como o nada bate a porta, que me lembro morte e sorte, como encarnas revolução, como és tudo o que eu vejo, como o dois (não) veio depois.
e é o regresso à vida impedida, à vida sem ti e sem ela, sem ele e o outro. sem mim.

de repente o assunto é assunto e tu mergulhas bem fundo, fugindo do amor. cá estarei no fim dessa espera até ao tempo do que era e não volta a ser.*

*pluto, convite.
fotografia de maria do carmo.

sexta-feira, 4 de novembro de 2005

de nenhum fruto queiras só metade.*


não te percas na epiderme de ninguém. procura, e encontrarás o que está para além de um quarto de luzes mortas. não te esqueças de ti nesse quarto. esse quarto é efémero, é uma divisão de felicidade momentânea. não tardes o encontro com as palavras que suplantam o silêncio. não sejas meio fruto e não queiras ter meias emoções. não sejas porto de passagem. não vivas de beijos com prazo, alegria limitada e choro contido. espera pelo todo, pelo completo, pelo inteiro.


*miguel torga.
fotograma de closer.

domingo, 30 de outubro de 2005

meteorologia interior.


previsão do tempo para amanhã(s):


períodos de céu muito nublado.
aguaceiros, especialmente durante a manhã.
condições favoráveis a ocorrência de trovoadas.
descida [drástica] da temperatura.

*imagem de maggie taylor.

quinta-feira, 27 de outubro de 2005

cegueira imposta.


I have seen too much
I haven't seen enough
you haven't seen it


[I'm] not scaremongering
this is really happening

radiohead, idiotheque.

quarta-feira, 26 de outubro de 2005

as if they knew.


o meu horóscopo diz para não sair de casa sem um mapa.
começo a acreditar na astrologia.

*fotografia de annabel mehran.

segunda-feira, 24 de outubro de 2005

la llorona.



ya me canso de llorar y no amanece

ya no sé si maldecirte o por ti rezar
tengo miedo de buscarte y de encontrarte
donde me aseguran mis amigos que te vas
hay momentos en que quisiera mejor rajarme
y arrancarme ya los clavos de mi penar

paloma negra, frida OST.


o que tu não sabes é que foi com friducha e su panzón que o teu amor por mim ardeu, que eu vi o teu amor tornar-se fogo. fogo de vista, digo eu.

pe[r]dido.



os clientes dizem-lhe que os pedidos demoram muito a ser atendidos.
o que eles não sabem é que ela espera, ainda hoje, que o dela seja atendido.





fotografia da minha francisquinha.

da partida [I].


partiu para esse futuro (in)esperado. na viagem, reparou no seu reflexo.
guardava o sorriso para o menino da cidade-luz.
à chegada, subiu as escadas e quis lá ficar bem no cimo. mas caiu. caiu e com ela cairam as ilusões, o mundo e tudo o que ele comporta.
entrou de novo no comboio. o corpo em combustão, a esperança que se foi queimando rapidamente, apoiada nos caminhos-de-ferro.
a incompatibilidade de emoções. a certeza de querer e a outra certeza - a de que(m) não (a) quer.
como era bom viver numa incerteza feita de beijos prolongados, silenciosos, escritos em qualquer espaço - lembras-te? a incerteza numa noite maior, de luz apagada, de defeitos e pesadelos escondidos.
os olhos verdes-verdes, esses, repararam no reflexo, pintado de preto e de branco, como se não existissem mais cores no mundo. como se ela não visse as outras cores do mundo. ela não vê as outras cores do mundo.

*fotograma de before sunrise.

terça-feira, 18 de outubro de 2005

avesso.


onde pus as chaves de casa? quarto do avesso, roupa do avesso, eu do avesso. 'cause I know I'm a mess he don't wanna clean up. não encontro as chaves de casa e as do meu próprio corpo. estou presa dentro de mim. como poderia saber onde estão as chaves, se nem sei onde moro?
sono. muito sono. fruto de dias fragmentados. aglomerados de sobe escadas, desce escadas, tira cafés, sorri para as pessoas, finge que és feliz. estás sempre tão bem disposta!, dizem-me. sou mesmo boa nisto. em fingir, digo eu. transparecer uma felicidade carnavalesca, rica em adereços barrocos que vou coleccionando aqui e ali, hoje e amanhã, dentro de um baú cheio de sonhos [ultra]passados, mal passados, crus, não começados ou que nem tiveram espaço para começar. sim, eu virada do avesso. verificar se estou inteira por dentro.

*fotografia de anna olsson.


sexta-feira, 14 de outubro de 2005

dia dançante.


oh I'm scared of the middle place
between light and nowhere
I don't want to be the one
left in there, left in there

antony and the johnsons, hope there's someone.

porque o dia de hoje parece ter dançado ao som desta melodia.
as horas esperavam alguém que me guardasse, os minutos pediam a liberdade do coração num cansaço maior, os segundos choravam o sono e a exaustão e o fantasma sempre de volta de mim.
porque a noite chegou e o dia de hoje pediu que eu não chegasse sozinha, no fim. pediu que esse guardador de um amanhã mais sorridente me levasse para outro dia. um dia que não dançasse ao som desta melodia.

quarta-feira, 12 de outubro de 2005

permeável.


hoje ela era uma
menina de chapéu-de-chuva transparente e toda a gente pode ver a chuva a inundar a força dela.
está perdida numa tradução e quer viver nesse lugar estranho. juntar palavras de horas nocturnas, passear um sorriso que não sabe se pode continuar no rosto amanhã, esperá-lo e não saber se algum dia chegará.
traduzir o presente num futuro (in)esperado.

o mundo está demasiado rápido, e ela demasiado lenta.

fotograma de lost in translation.

escrever silêncios.



o silêncio alimenta a palavra escrita.
a palavra escrita voa mais longe do que a palavra falada.
a palavra falada não adquire contornos da verdade que quero ler.
por isso, não fales.
lê o silêncio.

*fotografia de marie hochhaus

muito, meu amor.


mas gostava que soubesses que já gostava muito de ti, embora
ainda não tenha tido tempo de saber o que é isso de gostar muito de ti.
não, o que me assusta mesmo muito, quase terror por vezes, é depois não poder voltar atrás. quero dizer, depois de começar a gostar de ti como gosto, já não consigo desfazer isso que se fez, sei lá o quê, o que nos traz juntos até aqui.

*pedro paixão, muito, meu amor.
fotograma de amores regulares.

direito de resposta.



se ela se for embora, esvazia de ar puro a cidade insuflável, esvazia um balão de esperança em espíritos às cores, esvazia-me desse ar puro e dessa esperança.
elas estão cansadas porque não conseguem ser felizes, estão cansadas do tudo que se revela consecutivamente um nada.
ela não sabe para onde vai. ela tem de ficar, mesmo querendo ir também.
ela não percebe que o entre-linhas se alimenta também do arroz-doce.
para rir contigo, para chorar contigo, para espalhar imagens mesmo que em sistema binário. para mim e para todos os que gostam do teu (tão teu) 53.
antes tudo era mais a preto e mais a branco e não havia as cinquenta e três cores que eu não conhecia, que estavam ao meu lado e eu não conhecia.
provei o arroz-doce e soube, desde a primeira colher, que este sabor novo já me era tão familiar.

*fotografia do pedrinho.

sexta-feira, 7 de outubro de 2005

paper bag.


hoje sou uma folha amarrotada.
não.
sou uma folha em branco amarrotada.
uma folha pequenina, em branco, amarrotada.

quinta-feira, 6 de outubro de 2005

escadas.


relembro as palavras que subiram e desceram as escadas recônditas, afastadas de uma noite embebida em convívio colectivo para tantos.hoje queria estar nessas escadas, ora de sorrisos tímidos a evitarem o contacto directo e o silêncio inerente ao momento esperado, ora de olhar atento a cada gesto, cada ideia, cada reflexo.
o medo persiste. não sei se as palavras podem ir até ao mais elevado degrau ou se terão de ficar pela base. mas a descoberta feita na lentidão do passar dos dias continuará. hoje e amanhã e depois de amanhã queria subir essas escadas.

quarta-feira, 5 de outubro de 2005

behind all the clowning.


por detrás da palavra, fica tanto por dizer.


fotografia roubada à querida lebre.